Thursday, July 27, 2006

A cantiga do Zé

"O Zé não sabe onde pôr as mãos
E está farto de as ter no ar
Não teve sorte com os padrinhos
Nem tem jeito para roubar

O Zé podia arranjar emprego
E matar-se a trabalhar
Mas olha em volta e o que vê
Não o pode entusiasmar

E a cidade cá está para o entreter
Indiferente e fria, disposta a esquecer
Que a ansiedade é um minotauro
Que se alimenta de solidão
E que a ternura é uma bruxa
Que faz milagres
Se a mente a deixar ser

O Zé está vivo e é das tais pessoas
Que sentem prazer em rir
Mas tenho visto ultimamente
Esse gosto diminuir

O Zé experimenta um certo vazio
Comum a uma geração
Que despertou da adolescência
Com "vivas" à revolução

E a cidade cá está para o entreter
Indiferente e fria, disposta a esquecer
Que a ansiedade é um minotauro
Que se alimenta de solidão
E que a ternura é uma bruxa
Que faz milagres
Se a mente a deixar ser."


Jorge Palma

Tuesday, July 25, 2006

O Homem em Eclipse

Ora foi que certo dia
o homem eclipsou-se.
-A data!Digam a data,
a datasinha, faz favor!
-Qual data!Foi por decreto
que o homem se eclipsou,
foi só manobra, espertice,
um, dois, três e, pronto, é noite,
que nem a Lua apareça
seja de que lado for!

Uns seguraram-se logo,
eram espertos bem se viu,
outros caíram ao mar
com cabeça pernas e tudo.
Quanto a mim perdi a calma,
fiquei desaparafusado,
tradição, cultura, estilo,
certeza, amigos, fatiota.
Tudo fora do seu sítio
-um desaparafuso terrível!

Segurem-me, camaradas,
sinto pernas a boiar,
cheiro fantasmas, enxofre,
estou aqui mas posso voar,
o parafuso da língua
vai partido, vai saltar.
Agarrem-me!Agarra!Pronto.
Pari o mais leve que o ar
.

Mário Cesariny